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O Medo Silencioso das Passageiras:

A realidade de ser mulher em corridas por aplicativo.

11/06/2025

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Fonte| banco de dados freepik

POR | Bruna Einecke, Jessica hemsing e Simony Grave

Com a rotina cada vez mais acelerada e a infraestrutura do transporte público longe de atender às necessidades da população, moradores de Frederico Westphalen têm recorrido, cada vez mais, a alternativas digitais para se locomover. Em meio à ausência de um sistema coletivo eficiente, os aplicativos de transporte vêm ganhando espaço e transformando a forma como os frederiquenses se deslocam pela cidade.

 

Desde que serviços como Uber chegaram ao Brasil em 2015, o mercado de mobilidade urbana vive uma revolução. Dez anos depois, o modelo se consolidou e impulsionou o surgimento de novas plataformas em diferentes regiões do país. No Rio Grande do Sul, nomes como Garupa, Guri App, CarSul e Rota 77 despontam como soluções locais. Em Frederico Westphalen, os aplicativos Garupa, Rota 77 e Pop Move passaram a fazer parte do cotidiano da população, oferecendo uma alternativa rápida e "acessível" diante das limitações do transporte público.

MULHERES

Ser mulher no Brasil é, muitas vezes, conviver com o medo. Medo do desconhecido, do escuro, do trajeto para casa. Medo de andar sozinha, mesmo que em plena luz do dia. Esse receio constante se agrava quando o assunto é mobilidade urbana – especialmente para quem depende de transportes coletivos ou por aplicativo para ir e vir. A violência de gênero, estrutural e persistente, se infiltra também no trânsito e nas plataformas digitais de transporte, onde motoristas e passageiras convivem sob riscos nem sempre visíveis, mas profundamente sentidos.

 

A construção do que é ser mulher ainda está enraizada em um sistema patriarcal, onde os espaços públicos historicamente são delimitados para os homens. Quando elas ocupam esses espaços, muitas vezes precisam negociar sua presença com estratégias de autoproteção. No transporte, isso significa mudar o trajeto, simular ligações ou, muitas vezes, simplesmente deixar de sair.

 

De acordo com a Lei Maria da Penha (nº 11.340/2006), a violência contra a mulher é caracterizada como qualquer ação ou omissão baseada no gênero que cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual, psicológico e dano moral ou patrimonial. Ainda assim, a violência nos transportes persiste de forma alarmante. Uma pesquisa realizada pelos institutos Patrícia Galvão e Locomotiva, com apoio da Uber, revelou que 97% das brasileiras com mais de 18 anos já foram assediadas durante uma corrida por aplicativo. O dado expõe um cenário grave e cotidiano, muitas vezes ignorado.

ELAS NO TRANSPORTE EM FREDERICO

Frederico Westphalen, assim como outras cidades do interior, tem presenciado o crescimento no uso de plataformas como Rota 77, Garupa e Pop Move. No entanto, essa alternativa representa uma insegurança as mulheres. Essa insegurança é evidenciada no relato de Monique Fernanda, que tem uma motorista fixa, como uma escolha para se sentir segura:

 

 

 

Isso reforça a importância de repensar a mobilidade não apenas como deslocamento, mas como direito – e segurança como parte essencial desse direito. Além das passageiras, motoristas mulheres também enfrentam uma série de desafios. Muitas relatam que ingressaram na profissão por conta de conflitos pessoais, dificuldades financeiras ou para buscar maior autonomia. O ambiente de trabalho ainda é percebido como masculino. Em entrevista com uma das motoristas do garupa Martha Kempka, ela relata sua rotina, e como percebe essa escolha de varias mulheres ao escolher uma motorista mulher para se sentir segura:

relato de monique
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entrevista com martha Kempka

CONSEQUÊNCIAS DO MEDO

Segundo a psicóloga Cláudia Curioletti, o impacto psicológico dessas violências é profundo. “Situações recorrentes de assédio e insegurança provocam ansiedade, medo constante e podem desencadear quadros de estresse pós-traumático. Além disso, afetam diretamente a liberdade das mulheres de circular pela cidade”, explica.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Diante desse cenário, cresce a pressão por regulamentações mais eficazes. Em fevereiro de 2025, o senador Rogério Carvalho (PT/SE) apresentou um projeto de lei (PL 643/2025) que propõe alterações na Política Nacional de Mobilidade Urbana. A proposta exige que os aplicativos ofereçam a opção de escolher motoristas mulheres, sem cobrança adicional para as passageiras. A medida busca enfrentar uma lacuna legal existente: atualmente, a legislação não prevê mecanismos adequados para lidar com casos de importunação sexual dentro desses serviços, nem responsabiliza claramente as empresas envolvidas.

 

A proposta ainda tramita no Senado, mas já é vista como um avanço na luta por uma mobilidade mais segura, acessível e inclusiva para todas as mulheres brasileiras – inclusive aquelas que dependem diariamente do transporte alternativo em cidades do interior como Frederico Westphalen.

psicologa Cláudia Curioletti

CONECTANDO PARA NOSSA REALIDADE

Na pesquisa realizada para a reportagem, buscamos entender como as mulheres que estudam no campus da UFSM em Frederico Westphalen vivenciam a sensação de assédio ao utilizar o transporte por aplicativo. Obtivemos um total de 22 respostas de estudantes dos cursos de Jornalismo (11 respostas), Relações Públicas (7 respostas) e Engenharia Florestal (4 respostas).

Ao perguntarmos sobre a sensação de insegurança ao utilizar o transporte por aplicativo, 12 das entrevistadas (54,5%) afirmaram que se sentem inseguras "às vezes", enquanto 7 delas (40,9%) responderam que se sentem inseguras "sempre". Essa realidade evidencia a constante vulnerabilidade e insegurança que as mulheres enfrentam, mesmo em cidades menores. Embora muitas vezes se associe esses problemas a grandes centros urbanos, as situações de risco e os desafios de segurança também estão presentes em lugares onde, à primeira vista, a sensação de proteção poderia ser maior.

Em relação à experiência pessoal de assédio (seja moral, verbal ou físico) no transporte por aplicativo, a maioria das participantes, 68,2% (15 entrevistadas), afirmou não ter passado por essa situação, enquanto 31,8% (7 entrevistadas) relataram já ter sido vítimas desse tipo de crime. No entanto, quando perguntadas se conheciam outras mulheres que haviam sofrido alguma forma de assédio durante o uso do transporte por aplicativo, 45,5% das participantes responderam afirmativamente. Esses dados demonstram que grande parte das mulheres, embora não tenha vivido, infelizmente presenciou algum caso de assédio, demonstrando assim a normalização desse tipo de delito. 

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Fonte| gráfico elaborado a partir da pesquisa feita pelo google forms

Fonte| gráfico elaborado a partir da pesquisa feita pelo google forms

O medo silencioso que permeia a experiência de mobilidade urbana das mulheres revela a fragilidade do direito de ir e vir em um contexto onde a segurança ainda é uma incerteza. Mesmo em cidades menores como Frederico Westphalen, o deslocamento por meio de aplicativos de transporte, embora mais prático, não se desliga do receio constante de situações perigosas. A sensação de insegurança é uma sombra que acompanha muitas mulheres, que, mesmo em plena luz do dia, se veem forçadas a alterar seus trajetos, manter vigilância extra ou até mesmo abdicar de certos deslocamentos. O impacto psicológico desse medo constante é profundo, pois interfere na liberdade de movimento e na qualidade de vida das passageiras. Para que a mobilidade urbana seja de fato inclusiva, é imprescindível que a segurança seja uma prioridade nas políticas públicas e nos serviços de transporte, garantindo que o direito de transitar pela cidade não seja marcado pelo receio de o que pode acontecer ao longo do caminho.

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